A norte do Rego, no concelho de Celorico de Basto, há uma impressionante coleção de moinhos restaurados conhecidos coletivamente como os Moinhos de Argontim. É o tipo de sítio que me deixa a babar. Ao longo dos anos, passámos muitas vezes pela pequena placa castanha e branca dos moinhos, sempre com a promessa de os visitar "na próxima vez", mas só num domingo quente é que tivemos oportunidade de sair da estrada principal para ir ver. O local anuncia-se como um "circuito" de dez moinhos de água espalhados ao longo do pequeno rio Bugio e decidimos que um passeio ao longo do rio para inspecionar os dez moinhos seria um bom aperitivo antes do almoço de piquenique.

Foi o que pensámos, mas a realidade foi um pouco diferente. Foi muito fácil encontrar o local - a uns meros 300 metros da estrada - mas, uma vez lá chegados, verificámos que o museu-centro de informação estava firmemente fechado e que o acesso aos moinhos era muito limitado. Não havia mais ninguém por perto, o que tornou o local bastante assustador.


Alguns dos caminhos ao longo do rio estavam seriamente cobertos de vegetação e arrependi-me de não ter posto a catana no carro, porque o trilho em ambas as direcções, a montante e a jusante, depressa se tornou intransitável. Fomos por onde pudemos, ignorando corajosamente o rasgar das silvas na carne exposta, e conseguimos contar nove dos dez edifícios, mas só conseguimos chegar a metade deles - e estavam todos fechados.


A localização do décimo permanece um mistério até hoje. É uma pena.

Autor: Fitch O'Connell;

Como já disse, adoro olhar para a maquinaria que faz estas coisas funcionarem: os pinhões e engrenagens de madeira, os fusos de ferro, as comportas de manivela manual, os travões de couro. O melhor que pude fazer foi olhar através das janelas e pingar nos vidros. Os moinhos ao longo do Bugio tinham como principal atividade a moagem de cereais - e há uma história deles naquele local que remonta ao século XI, embora um se dedicasse à prensagem de azeitonas e o maior fosse uma antiga serração de madeiras, movida por duas impressionantes rodas de água verticais.


Moinho de água


O nome oficial de um moinho de água em português é moinho de água, mas uma palavra frequentemente utilizada para os designar é azenha. Não me tinha apercebido, até procurar alguma informação sobre o moinho noutro local, que azenha se refere a um tipo particular de moinho de água. O outro tipo de moinho é um rodizio, que, na minha experiência (e na de muitos outros), é um termo normalmente reservado para um enorme buffet de carne ao estilo brasileiro. A diferença é simples: uma azenha tem uma roda de água vertical e um rodízio tem uma horizontal. O moinho de roda horizontal foi introduzido pela primeira vez por volta da época da ocupação romana e, durante muito tempo, foi o tipo de moinho mais comum no país, devido à sua relativa facilidade de construção, uma vez que não necessita de um mecanismo de engrenagem.

Autor: Fitch O'Connell;

Havia uma pequena zona de piquenique à sombra, junto ao rio que corria, e decidimos almoçar e esperar. Um aviso desbotado na porta da antiga serração-centro de informação sugeria que alguém estaria lá às duas, embora não dissesse em que dia, mês ou ano esse grande evento poderia acontecer. Mais valia dizer que alguém poderia ou não estar lá às duas ou noutra altura qualquer, se a luz fosse boa e o vento não soprasse de leste e o gato não precisasse de ser desparasitado. Ou algo do género. Mas não podíamos ter escolhido um sítio melhor para almoçar, por isso comemos quiche e salada sentados numa mesa de pedra com vista para o lago do moinho. O som da água a correr dá-nos sempre uma sensação de tranquilidade e foi sobreposto por um doce canto de uma ave escondida, uma toutinegra qualquer, creio eu.


A nossa atenção foi capturada por um par de libélulas azuis eléctricas que estavam envolvidas numa dança altamente complexa e encenada, usando folhas a flutuar à superfície da água, algumas canas e algum musgo como cenário. Não éramos os únicos a observá-las a voar e a esvoaçar, a equilibrar-se e a saltar. Uma libélula verde-esmeralda sentou-se num galho e observou-as também. Sem dúvida que mais tarde foi para casa e queixou-se de que os azuis estavam a exibir-se novamente e de como eram embaraçosos.

As duas horas chegaram e passaram, assim como as duas e meia, e não havia sinal de que o local estivesse aberto. De facto, não havia sinal de ninguém. Por fim, decidimos juntar-nos ao resto do mundo, o mundo que não era constituído principalmente por toutinegras, libélulas, comportas e corridas de água. Pensando bem, alguém que chegasse a bater chaves para abrir portas teria quebrado o feitiço, por isso talvez tivéssemos tido sorte em escapar. Descobri recentemente que os moinhos estão prestes a ser remodelados e embelezados para os visitantes. Espero que se lembrem de deixar entrar o público.


Author

Fitch is a retired teacher trainer and academic writer who has lived in northern Portugal for over 30 years. Author of 'Rice & Chips', irreverent glimpses into Portugal, and other books.

Fitch O'Connell